No Dia Nacional da Adoção, refletimos sobre os desafios de acolher todas as infâncias — especialmente aquelas fora dos padrões idealizados. Entenda por que inclusão, afeto e pertencimento devem caminhar juntos nesse debate urgente.
O dia 25 de maio é, oficialmente, o Dia Nacional da Adoção. Mas, para além de sua função simbólica no calendário, essa data escancara uma urgência que ainda engatinha nas discussões públicas: o modo como, enquanto sociedade, reconhecemos — ou ignoramos — as múltiplas formas de infância que existem no Brasil.
Falar de adoção é, inevitavelmente, falar de pertencimento, de direitos, de afeto e de reparação. É olhar com honestidade para o fato de que nem toda criança tem as mesmas chances de ser acolhida, não por falta de merecimento, mas porque o próprio imaginário coletivo ainda é atravessado por filtros seletivos — muitas vezes inconscientes — sobre quem merece ser amado, cuidado, incluído.
Não se trata apenas de encontrar lares, mas de reconfigurar o modo como enxergamos o que é ser criança em um país marcado por desigualdades históricas. Quando falamos de adoção, estamos falando também de racismo estrutural, de capacitismo, de etarismo, de uma cultura que insiste em condicionar o afeto à ideia de conveniência. É um tema que exige coragem para desmontar narrativas simplistas e construir, com escuta e responsabilidade, caminhos reais de inclusão.

O ato de adotar: mais que uma escolha, um compromisso
Adotar vai muito além do desejo de ampliar a família — é um ato que implica assumir responsabilidade, acolhimento e transformação.
A adoção envolve abrir espaço para uma vida que, muitas vezes, traz consigo desafios invisíveis para um nova família que precisa estar preparado para acolher a bagagem que esse jovem traz consigo.
Adotar significa reconhecer a pluralidade das infâncias, abraçar histórias marcadas por rupturas, perdas e resistência, e se comprometer com um cuidado que exige empatia, paciência e coragem.
É um processo que transforma tanto quem é acolhido quanto quem acolhe, pois descortina realidades que exigem olhar atento, comprometido e, sobretudo, humano.
Mais do que um ato de amor individual, a adoção é uma prática social e política que, ao acolher o diferente, desafia os padrões impostos e contribui para construir uma sociedade mais justa, inclusiva e verdadeiramente diversa.
Desafios da adoção no Brasil
O sistema de adoção brasileiro nos confronta com uma dura realidade: as crianças e adolescentes que mais aguardam por um lar definitivo são as que carregam perfis complexos e marginalizados. Segundo o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania a maioria dessas infâncias tem mais de 7 anos, idade em que as chances de adoção diminuem drasticamente devido a preconceitos arraigados e à dificuldade em aceitar as necessidades específicas desses jovens. Além disso, grupos de irmãos permanecem juntos na espera por famílias dispostas a acolher não apenas um, mas múltiplos vínculos afetivos que jamais deveriam ser desfeitos.
Somam-se a esse quadro as crianças e adolescentes com deficiências, que representam uma parcela significativa dos que esperam por adoção — cerca de 18%. Para esses menores, a barreira é dupla: não apenas a espera pela adoção, mas o estigma e o desconhecimento sobre suas condições, que afastam pretendentes e dificultam um acolhimento que, quando ocorre, exige cuidado, informação e suporte especializados.
Esses números não são apenas estatísticas; são reflexos de uma sociedade que ainda hesita em abraçar a diversidade da infância real — uma infância que transcende o ideal neurotípico, saudável e sem traumas. Entender quem são essas crianças e adolescentes é compreender que o desafio da adoção vai muito além da burocracia e da vontade individual: é um desafio estrutural, que exige transformação cultural, ética e política.
O que está em jogo é o direito de todas as infâncias a serem acolhidas com respeito, dignidade e humanidade. A adoção é um compromisso social que precisa romper com preconceitos e oferecer suporte real para que cada criança, independentemente de idade, condição ou história, encontre seu lugar no mundo.
A neurodivergência no sistema de acolhimento
Infelizmente, crianças neurodivergentes ainda são vistas como “casos difíceis” dentro do sistema. Isso acontece por vários motivos: falta de diagnóstico adequado, escassez de profissionais capacitados, ausência de políticas públicas específicas e, claro, o preconceito social contra comportamentos atípicos.
O problema se agrava quando essas crianças são institucionalizadas sem o suporte necessário. Muitas vezes, elas passam anos em abrigos sem receber atendimento adequado, sem vínculos afetivos estáveis e sem espaço para desenvolver sua identidade de forma segura.
E aqui vem o ponto crucial: não existe inclusão sem preparo. Adotar uma criança neurodivergente exige mais do que boa vontade — exige suporte, escuta, estrutura e conhecimento.
Adoção e capacitismo: onde estamos errando?
Muita gente acha bonito dizer que “todas as crianças merecem um lar”, mas na prática, são poucos os que se dispõem a quebrar o ciclo de exclusão.
- Quantas pessoas estão dispostas a adotar uma criança com TEA, por exemplo, sabendo que ela pode ter crises sensoriais, dificuldades de linguagem ou desafios na escola?
- Quantas famílias têm acesso a terapeutas, escolas inclusivas, profissionais especializados? Quantas sequer sabem o que é neurodivergência?
E mais: quantas acreditam, de fato, que uma criança neurodivergente tem tanto direito à felicidade quanto qualquer outra? Enquanto essas perguntas não forem respondidas com honestidade, seguiremos romantizando a adoção e negligenciando o cuidado real que ela exige.
Inclusão começa na escuta (e não no julgamento)
A inclusão começa quando paramos de esperar crianças que se encaixem nos nossos moldes — e passamos a adaptar os moldes para acolher quem elas são. Isso vale para filhos biológicos, adotivos ou qualquer criança com quem a gente se comprometa.
Uma infância saudável não é aquela sem desafios — é aquela em que os desafios podem ser enfrentados com afeto, suporte e pertencimento.
Isso exige que o sistema de adoção:
- Faça diagnósticos precoces e bem conduzidos;
- Ofereça suporte psicológico às famílias adotantes e às crianças;
- Capacite profissionais de abrigos, escolas e saúde;
- Rompa com o capacitismo estrutural que impede essas crianças de serem vistas como adotáveis.
Adoção não é caridade
Aqui na Braine, a gente costuma dizer que cuidado não é mimo, é base. E isso vale especialmente para a infância.
Adotar não é um ato de salvação. É um compromisso radical com o crescimento, com os traumas, com as potências e com a dignidade de uma criança. E esse compromisso precisa estar ancorado na escuta da diferença, na aceitação das múltiplas formas de ser e na criação de um ambiente seguro para o desenvolvimento pleno.
O compromisso da Braine com a inclusão de todas as infâncias
Na Braine, quando falamos sobre acolhimento e inclusão, estamos falando de um compromisso contínuo com a transformação estrutural da forma como enxergamos, cuidamos e integramos a diversidade desde o início da vida.
Entendemos que o futuro de uma sociedade mais justa começa no presente da infância, e para que essa infância seja de fato acolhida em sua pluralidade, é preciso derrubar os muros invisíveis que afastam tantas crianças e adolescentes do afeto, da segurança e da oportunidade de se desenvolverem plenamente — especialmente aqueles que estão fora do padrão idealizado de família, comportamento ou corpo.
A Braine desenvolve tecnologias que escutam com empatia e atuam com inteligência, não só no sentido técnico, mas emocional e ético.
Nossas soluções como o AURA-T, voltado ao rastreio e apoio no diagnóstico do autismo, ou a Bruna, nossa assistente sensível de IA para suporte emocional, são instrumentos pensados para facilitar o cuidado, fortalecer vínculos e construir pontes onde antes existiam silêncios.
Sabemos que muitas crianças neurodivergentes, com deficiência ou com histórico de trauma são justamente aquelas que mais esperam pela chance de serem adotadas. E é por isso que nosso trabalho se alinha diretamente com a missão de tornar o acolhimento mais possível, mais acessível e mais consciente.
Incluir todas as infâncias exige mais do que boas intenções: exige ação, presença e ferramentas adequadas.
A Braine existe para criar essas ferramentas — e para garantir que nenhuma criança fique para trás simplesmente por ser quem é.
O que podemos fazer agora?
Se você é profissional da saúde, da educação, da assistência social ou da justiça, aqui vão alguns pontos de ação:
- Estude sobre neurodivergência na infância e os impactos do trauma no desenvolvimento.
- Questione seus próprios preconceitos ao avaliar perfis de adoção.
- Coloque o bem-estar da criança — e não apenas o desejo da família — no centro do processo.
- Incentive políticas públicas voltadas para suporte pós-adoção, especialmente para famílias que acolhem crianças com necessidades específicas.
E se você é alguém que está pensando em adotar, ou quer apoiar famílias que adotaram:
- Busque formação e escuta ativa.
- Fuja de discursos romantizados.
- Lembre-se: nenhuma criança nasce pronta. Mas toda criança merece alguém que esteja pronto para estar com ela no processo.
Um chamado à ação
Neste 25 de maio, te convidamos a conhecer a Braine saber mais sobre a inclusão de pessoas neurodivergentes e da diversidade em sua totalidade.
Vamos falar de inclusão como prática e não como discurso, vamos falar de infâncias reais, com todas as suas camadas, e de laços possíveis, mesmo nos contextos mais desafiadores.